NOSSO CAMINHO AVANÇANDO PARA A FELICIDADE

Nadja do Couto Valle (Rio de Janeiro, Brasil)

“Contam que um jovem sedento de afirmação espiritual procurou certa vez o pensador e sacerdote hebreu Shammai e o interrogou:

– Poderias ensinar-me toda a Bíblia durante o tempo em que eu possa quedar-me de pé, num só pé?

– Impossível! – respondeu-lhe o filósofo religioso.

– Então de nada me serve a tua doutrina – redarguiu o moço.

Logo após buscou Hilel, o famoso doutor, propondo-lhe a mesma indagação. O mestre, acostumado à sistemática da lógica e da argumentação, mas, também, conhecedor das angústias humanas, respondeu:

– Toma a posição.

– Pronto! – retrucou o moço.

– Ama! – elucidou Hilel.

– Só isso?! E o resto, que existe na Bíblia? – inquiriu, apressadamente.

– Basta o amor – concluiu o austero religioso. – Todo o restante da Bíblia é somente para explicar isso.”1

Vemos que o amor do homem foi considerado por Hilel como o núcleo de todo o ensino judaico, reconhecendo o preceito bíblico de amor fraterno como princípio fundamental da lei moral judaica. Lembremos que a mesma coisa foi ensinada por Paulo, um aluno de Gamaliel, o neto de Hilel, e, mais amplamente, por Jesus, quando declarou que o amor ao próximo era o segundo grande mandamento além do amor de Deus, o primeiro.

Nesse diálogo, ficam manifestas duas questões. A juventude, sabidamente, é curiosa e imediatista, feições explicitadas nessa passagem. Por outro lado, do ponto de vista de seu interlocutor, fica explicitada a capacidade, o trabalho intelectual ao nível de síntese na resposta de Hilel, lembrando que essa é uma habilidade própria de Espíritos amadurecidos, com expressivas conquistas espirituais.

A busca de resposta para problemas transcendentais é própria de seres humanos. Constatamos, na atualidade, que ela está presente nas criaturas de todas as faixas etárias, que buscam respostas para as amargas crises que a Humanidade enfrenta, pois são chegados os tempos, com choro e ranger de dentes, como anunciou Jesus2. Na verdade, todos buscamos respostas para os cataclismos físicos e morais que assolam o Planeta, a todos envolvendo em vibrações de exploração do homem pelo homem, de Estados por Estados, de ódio, preconceito, ira, enfermidades graves como câncer e Aids, de promessas vãs de ilusões douradas, que conquistam a juventude despreparada para o enfrentamento de crises, de casos dramáticos da infância e juventude abandonadas em guerras e êxodo de migrações jamais vistas na história da Humanidade…

As criaturas hoje buscam um sentido para tudo isso, um refúgio em Deus e em Jesus, mas também em sistemas de ideias. Muitas criaturas recorrem ao que hoje se chama de “sínteses pessoais”, compostas por ideias e conceitos de várias religiões, cada um compondo uma espécie de conjunto de retalhos de conceitos de várias vertentes religiosas.

Destaca-se como uma grande causa dos desequilíbrios na atualidade a questão da injustiça, que brota do egoísmo, a maior chaga da Humanidade, como assinalam os Espíritos Orientadores da Humanidade a Allan Kardec, em O Livro dos Espíritos3. Indaga-se: Como se dará a grande transformação, anunciada por Jesus e ratificada em O Livro dos Espíritos, na resposta à questão 10194, com a qual se encerra essa obra?

O bem reinará na Terra quando, entre os Espíritos que a vêm habitar, os bons predominarem, porque, então, farão que aí reinem o amor e a justiça, fonte do bem e da felicidade. Por meio do progresso moral e praticando as Leis de Deus é que o homem atrairá para a Terra os bons Espíritos e dela afastará os maus. (…)

Essa transformação se dará, portanto, pelo Amor! O amor ao próximo e a prática da caridade são os pilares da verdadeira justiça, base para a construção da Paz no mundo. Lembramos o Sermão do Monte5, em sua quarta bem-aventurança: “Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque serão fartos”, significando que devemos estar desejosos de nos ligarmos a Deus, a Jesus, aos Mentores Espirituais – e ao fazermos isso, imediatamente sentimos um fluxo de bem-estar, de apaziguamento de nosso mundo íntimo, de leveza e contentamento. Paulo, o Apóstolo dos Gentios, aconselhou os Efésios: “Toda a amargura, cólera, ira, gritaria e blasfêmia sejam retiradas dentre vós, bem como a malícia.” (Efésios, 4:31) E anota para o jovem Timóteo, que ele considerava como um filho: “Entesourando para si mesmos um bom fundamento para o futuro, para que possam alcançar a verdadeira vida.” (I Timóteo, 6:19)

Claro está que a caridade é um conceito progressivo material e moral, e também cumulativo, aumentando em extensão e profundidade, de acordo com o nível evolutivo que a criatura vai alcançando – um conceito, portanto, que une as criaturas. É de tal importância que o Codificador Allan Kardec definiu e orientou6, em O Evangelho segundo o Espiritismo: “Fora da Caridade Não Há Salvação”.

Portanto, se desejamos nosso próprio aperfeiçoamento, devemos aproveitar as lições, ensinamentos e oportunidades de cada momento, como palavras de ordem. Despojarmo-nos do inútil, partilharmos o que seja útil, com nosso desapego, afastarmo-nos da inquietação e da correria, de nossos comportamentos irritadiços, identificarmos nossas próprias tendências e nossas necessidades para não caminharmos na sombra de ideias negativas e do que precisamos renovar, modificar em nosso próprio acervo espiritual, recolher as mensagens que nos enobreçam, preocuparmo-nos com o que é justo e verdadeiro, sem comprar ou acompanhar e patrocinar aflições e assim por diante.

Isto, como nos disse Paulo (Efésios 2:10), porque “somos a feitura dele, criados em Jesus Cristo para boas obras.” Diz-nos ainda, a propósito, Emmanuel7: “Não te esqueças, pois, de que viver é atributo de todos, mas viver bem é o caminho de quantos se dirigem, leais ao Bem, para a divina luz da Vida Real.”

Lembramos que o caminho dos que nos dirigimos, “leais ao Bem, para a divina luz da Vida Real”, vai se delineando, em pegadas de luz crescente, à medida que nos desenvolvemos na trilha de uma ética progressiva, que nos direciona para a culminância da Ética e da Moral – o bem, a virtude, o dever, que se opõem ao mal, ao vício, à culpa… “Tudo o que quereis que vos façam, fazei-o também vós a eles.” (Mateus 7:12)

O estudo rigoroso e a prática dos postulados do Espiritismo são o caminho seguro e mais rápido para alcançarmos essa culminância de Alegria Divina e felicidade, consagrando a expectativa de Deus a nosso respeito, o que explicitou Paulo, dirigindo-se aos hebreus (Hebreus, 6:9), e a nós, hoje, nos momentos decisivos em que nosso Planeta se habilita à promoção de orbe de Regeneração:

“Mas de vós, ó amados, esperamos coisas melhores.”

Referências

1 FRANCO, Divaldo. Estudos espíritas. Pelo Espírito Joanna de Ângelis. 3.ed. Rio de Janeiro: Federação Espírita Brasileira, 1983. Apresentação, pela Autora Espiritual, p. 14.

2 BÍBLIA. N.T. Mateus. Bíblia de estudo Almeida. Tradução de João Ferreira de Almeida, revista e ampliada. 2.ed. Barueri, SP: Sociedade Bíblica do Brasil, 1999. Cap. 13, vers. 42; 50; cap. 8, vers. 12; cap. 22, vers. 13; cap. 24, vers. 51; cap. 25, vers. 30; Lucas cap. 13, vers. 28-55.

3 KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. Tradução de Guillon Ribeiro. 93.ed. 1.imp. (Edição Histórica). Brasília: Federação Espírita Brasileira, 2013. q. 913.

4 Idem. questão 1019.

5 BÍBLIA. N.T. Mateus. O Sermão do Monte. Op. cit. Cap. 5, vers. 3-12. Ver também      KARDEC, Allan. O Evangelho segundo o Espiritismo. Tradução de Guillon Ribeiro. 131.ed. 3.imp. (Edição Histórica). Brasília: Federação Espírita Brasileira, 2013. Cap. V, VII, VIII, IX, X.

6 KARDEC, Allan. O Evangelho segundo o Espiritismo. Op. cit. cap. XV.

7 XAVIER, Francisco Cândido. Palavras de vida eterna. Pelo Espírito Emmanuel. [s.e.] 36. reimp.Uberaba, MG: Comunhão Espírita Cristã, 2012. Cap. 63, “No Campo da Vida”, p. 144.

Nadja do Couto Valle 

Doutora em Filosofia, Mestre em Educação, Graduada e Licenciada em Letras Português-Inglês, Pós-Graduada também em Literatura-Inglesa, atuou profissionalmente na Universalidade Federal do Rio de Janeiro-UFRJ, na formação de professores, como Professora de Didática do então Departamento de Didática da Faculdade de Educação, onde implantou a coordenação do Curso de Pedagogia, tento sido sua primeira Coordenadora, e como Diretora do Colégio de Aplicação e Diretora de Ensino de Graduação da Pró-Reitoria de Ensino de Graduação e Corpo Discente da mesma Universidade.

Professora da Rede de Ensino do Estado do Rio de Janeiro, na então Escola Normal, com ampla experiência no Conselho Estadual de Educação do Rio de Janeiro.

Coordenadora de Curso de Projeto Nacional de Treinamento de Professores de vários Estados do Brasil, em convenio UFRJ-MEC-FGV.

Como espírita desenvolve atividades como passista e de efeitos físicos, dirigente de reunião mediúnica, no Grupo Espírita André Luiz, na cidade do Rio de Janeiro, conferencista e escritora; é editora da Revista Cultura Espírita, do Instituto de Cultura Espírita do Brasil-ICEB, na qual assina a coluna Pelos Caminhos da educação; há vinte anos integra a equipe de voluntários da Radio Rio de Janeiro-1400AM, como produtora e apresentadora de três programas, inclusive o Pelos Caminhos da Educação, e participa de um outro como debatedora; assina artigos na Revista Reformador, da Federação Espírita Brasileira, e em outros órgãos de divulgação Espírita.

Como escritora, destacam-se Reflexões à luz do Espiritismo; o capítulo “Materialismo e espiritualismo na filosofia: culminâncias e sínteses” na obra Em torno de Ravail: o mundo em que viveu Allan Kardec; o capítulo “Pais adolescentes” no livro O Jovem Espírita quer saber; a série Pelos Caminhos da Educação: Pelos Caminhos da Educação(vol. 1), Desafios da atualidade(vol. 2), Bullying, cyberbullying e dependências(vol.3), No mundo da criança(vol.4); Ascese do Espírito; – obras nas quais aborda corajosamente temas-desafio na atualidade, geralmente evitados até por professores e educadores, e que a autora coloca sob o prisma da Filosofia, da ciência da Educação e da Filosofia do Espiritismo codificado por Allan Kardec, contribuindo para uma leitura do mundo fundamentada na razão e no sentimento, sob a ótica conceitual do ser integral à luz da ação ético-moral indicada pelo Evangelho de Jesus, assim propiciando aos leitores uma diretriz para seu processo de autoconhecimento e auto-educação, para ajudarem a si mesmo e ao outro.